quarta-feira, 28 de setembro de 2011

Rapazes podem vir a tomar vacina para prevenir cancro


 


Vírus do papiloma humano. O VPH é conhecido das mulheres que, de dois em dois anos, fazem o teste de Papanicolau para despistar lesões no colo do útero (que podem evoluir para cancro), mas é muito provável que seja um desconhecido para a maioria dos homens. Será, por isso, uma novidade para muitos que este mesmo vírus seja o responsável por cada vez mais casos de cancro da cabeça e do pescoço, uma doença que afecta maioritariamente homens.
Em países como a Suécia e o Canadá, a percentagem deste tipo de cancros associados ao VPH, onde se incluem os tumores da faringe, já soma 70%. Até há bem pouco tempo, tabaco e álcool eram os principais factores de risco, mas a mudança dos hábitos sexuais nas últimas décadas poderá agora estar a ter efeito, explicou ao i Jan B. Vermoken, especialista da Universidade de Antuérpia e um dos médicos mais conceituados na área. Vermoken defende mesmo haver sinais de que seria vantajoso começar a vacinar os rapazes contra este vírus, prevenção que já é feita junto das adolescentes (em Portugal no plano nacional de vacinação, de forma gratuita), mas também por todas as mulheres que o desejem.
Jean-Louis Lefebvre, director da Federação Internacional de Sociedades de Cancro da Cabeça e Pescoço, acrescenta que, neste momento, a hipótese está a ser avaliada pela comunidade médica, mas ainda não há um veredicto. Apesar de os países nórdicos registarem já uma elevada percentagem de casos associados ao VPH – algo que Vermoken classifica de epidemia –, em países como Portugal Lefebvre diz que serão 30%, mas com tendência a aumentar. Numa altura em que continuam a surgir algumas críticas quanto à eficácia e segurança da vacina contra o cancro do colo do útero – que protege contra estirpes também envolvidas no cancro da cabeça e pescoço –, a hipótese ainda não é certa. Sobre as dúvidas, Vermoken diz que é sobretudo uma questão de tempo. “Neste momento só temos dados de que as vacinas protegem de lesões pré-malignas, e aí sabemos que funciona. Se vão mesmo prevenir casos de cancro do colo do útero, só saberemos daqui a 20 anos. Mas se tivesse uma filha, vacinava-a.”
Os dois especialistas participaram nos últimos dias no Congresso Europeu de Oncologia Multidisciplinar 2011, onde um simpósio paralelo debateu a sensibilização da população para este tipo de cancro, uma lacuna bem mais imediata do que a eventual necessidade de alargar a vacinação.
No encontro, os especialistas divulgaram resultados de dois inquéritos realizados em 2008 e 2009 em vários países europeus, Portugal incluído, onde se percebe que a doença ainda é bastante desconhecida e que os doentes sentem necessidade de informação mais clara. Segundo os dados apresentados, 75% dos 7520 inquiridos não conheciam este tipo de cancro e 60% pensavam tratar-se de tumores cerebrais. Mais: apenas 15% sabia que a infecção com o VPH era um factor de risco. Apesar de sintomas como rouquidão ou mudanças na voz serem facilmente associados, outros também comuns como nariz entupido e dor no ouvido só foram reconhecidos por uma minoria. O cenário parece o de uma doença com um impacto mínimo, embora os números evoluam na direcção contraria: é o sexto tipo de cancro mais comum, com mais de 500 mil novos casos por ano e mais de 300 mil mortes associadas em 2008. Os tumores mais comuns surgem na boca, faringe e laringe.
Sem sentido No simpósio, além do debate sobre a melhor forma de passar informação sobre a doença, a grande novidade foi usar o teatro para sensibilizar o público. A peça “Senseless”, com um elenco profissional, pegou nos resultados dos inquéritos para criar um guião realista do que afasta os doentes do consultório. Brian, protagonista de meia-idade, e fumador, está há seis meses com uma tosse estranha e dificuldades em engolir ao ponto de ter passado a comer o mínimo indispensável. Tenta evitar ir ao médico, por prever que o vão proibir de fumar e de beber.
A notícia do cancro, mesmo apoiada por especialista, acaba por ser um choque e uma ideia que nunca lhe tinha passado pela cabeça. Para Lefebvre, mais do que não haver informação disponível por exemplo na internet, o facto de esta ser uma doença que afecta sobretudo homens – mais reticentes na hora de consultar os médicos, poderá explicar o atraso nos diagnósticos e a mortalidade elevada para o número de novos casos anuais. Os resultados do simpósio vão ser agora compilados para criar novas orientações europeias para prevenir a doença, a apresentar no início do próximo ano.
Fonte: Por Marta F. Reis, ionline, 28.09.11

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